segunda-feira, 30 de junho de 2014

Ecocardiograma com contraste- um exame de imagem, uma obra de arte, mas com utilidade clínica?

 Os exames de imagem cardiológicos são uma verdadeira obra de arte. Cada vez mais estão desenvolvendo tecnologias para melhorar a imagem cardiovascular, trazendo-a o mais próximo da realidade possível. Um exemplo disso é o ecocardiograma, exame complementar não-invasivo de diagnóstico, de avaliação de gravidade, de planejamento terapêutico e de estratificação prognóstica utilizado em quase todas as patologias cardíacas. O conceito técnico básico deste exame é utilizar um transdutor que gera ondas de ultra-som (alta frequência, acima dos níveis de audição humana) e que capta as ondas que refletiram e voltaram. Sendo que quanto maior a densidade de um meio, maior sua capacidade de refração do som, o aparelho consegue transformar assim os diferentes graus de refração do som em imagens do coração com detalhes sobre o mesmo, como tamanho, espessura, forma, modo como válvulas e câmaras estão trabalhando. Além de ser capaz também de identificar se alguma área do músculo cardíaco não está funcionando adequadamente por baixo fluxo sanguíneo ou lesão resultante de ataques cardíacos prévios.
             É um exame muito utilizado na investigação de sopro cardíaco, presença de palpitações, síncope, falta de ar, dor torácica, infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, doença das válvulas, anomalias congênitas, entre outras. Por não possuir efeitos colaterais e ter relativo baixo custo, facilidade de transporte e operacionabilidade, o ecocardiograma se tornou um dos exames mais pedidos da atualidade.
Assim como no mundo das artes, que há diversos modelos e sistemas de acordo com as experiências da época, a ecocardiografia mudou muito nas últimas décadas, criando diversas modalidades de geração de imagem, cada uma com um tipo de indicação clínica específica. Neste contexto, um dos últimos desenvolvimentos na área foi a utilização de contraste neste exame de imagem.
              O ecocardiograma contrastado consiste no uso de agentes de contraste à base de microbolhas injetados por via endovenosa periférica para melhorar o sinal ecocardiográfico. O mecanismo primário pelo qual a injeção de microbolhas contrasta as diferentes estruturas cardíacas é decorrente da introdução de múltiplas interfaces gás-líquido na circulação, levando ao aumento da reflexão do ultra-som e melhorando a qualidade das imagens ecocardiográficas.
             As microbolhas utilizadas atualmente são formadas por envoltório proteico ou lipídico contendo gases de alto peso molecular em seu interior, que lhes confere estabilidade suficiente para atravessar a barreira pulmonar e contrastar as cavidades cardíacas esquerdas e a circulação coronária. É um exame usado para melhorar a definição das bordas endocárdicas, opacificação do ventrículo esquerdo (dados utilizados na avaliação mais adequada da função contrátil global e segmentar do ventrículo esquerdo, e medidas mais acuradas dos volumes ventriculares e fração de ejeção, permite também avaliar presença de trombos, trabeculações, tumores dentro da cavidade ventricular, além da avaliação de anormalidades do ápice, tais como pseudoaneurisma, hipertrofia e abaulamento apicais), sendo aplicada a estudos em repouso ou sob estresse.
 






              A estabilidade dos agentes contrastantes na circulação junto com a alta tecnologia colocou a ecocardiografia com contraste como uma técnica segura e eficaz para avaliação da perfusão miocárdica. As aplicações clínicas da ecocardiografia com contraste miocárdico incluem a avaliação de pacientes com doença arterial coronária suspeita ou conhecida, a determinação da área de risco e eficácia das terapias de reperfusão em pacientes com infarto agudo do miocárdio e a avaliação de viabilidade miocárdica após o infarto (identificação do fenômeno de no-reflow, caracterizado pela ausência de perfusão microvascular apesar do restabelecimento da patência da artéria coronária epicárdica; é um marcador de necrose miocárdica e é associado com menor chance de recuperação funcional e pior prognóstico) e no contexto da doença arterial coronária crônica (identificação de miocárdio hibernado, que possui importância fundamental em pacientes com doença arterial coronária crônica para definir seu tratamento adequado, uma vez que a cirurgia de revascularização miocárdica pode resultar em melhora dos sintomas e diminuição de risco para eventos futuros). Estudos recentes têm demonstrado que a análise da perfusão miocárdica pela ecocardiografia com contraste miocárdico em tempo real apresenta maior sensibilidade e acurácia para o diagnóstico de doença arterial coronária que a análise da motilidade segmentar pela ecocardiografia sob estresse. A quantificação do fluxo miocárdico regional e da reserva de fluxo miocárdico pela ecocardiografia contrastada parece apresentar valor adicional para estimar a gravidade da doença coronária.
               Em conclusão, entende-se que a ecocardiografia com contraste é um método não-invasivo, sem radiação ionizante, seguro que propicia dados anatômicos cardiovascular, de fácil acesso e disponibilidade, com resultados rápidos, boa relação custo-benefício e dispõe de repetidas investigações científicas que ratificam o seu emprego na prática clínica, tanto para melhor definição das bordas cavitárias como para estudar a perfusão miocárdica. Por tudo isso, vê-se que não produz apenas imagens bonitas, mas possui grande utilidade clínica, com provável aumento de realização deste exame no futuro.
                 Espero que tenham gostado do texto e que tenham se apaixonado por estas incríveis imagens assim como eu!
Boa noite,
Amanda Caon Morioka
Coordenadora da Liga de Cardiologia da Unicamp
                
Referências:
Ecocardiografia com contraste. Tem futuro? Cláudio L. Pereira da Cunha. Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná - Curitiba, PR. Arq. Bras. Cardiol. vol.87 no.2 São Paulo Aug. 2006.


Uso clínico da ecocardiografia com contraste à base de microbolhas. Jeane Mike Tsutsui; Wilson Mathias Junior. Instituto do Coração do Hospital das Clínicas – FMUSP – São Paulo, SP. Arq. Bras. Cardiol. vol.88 no.5 São Paulo May 2007.

 Uso de Contrastes no Ecocardiograma em Repouso . 6 de junho de 2012. Lang, Ecocardiografia Dinâmica. Cardiologia | Medicina


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